Para Augusto Comte, notável filósofo, a ciência seria o meio a partir do qual a sociedade atingiria o “Estágio Positivo” – o máximo grau de desenvolvimento. Todavia, observa-se que, embora tenha ocorrido um intenso avanço científico na contemporaneidade, a humanidade não parece estar desfrutando de um momento de progresso. Pelo contrário, há uma crescente intensificação das desigualdades econômicas, das desavenças sociais e da destruição do planeta em que vivemos. Neste viés, é essencial assimilarmos os complexos fatores que levam o mundo contemporâneo a estar fora de ordem.

Em primeiro plano, considera-se fundamental destacar que o uso da racionalidade em função de uma lógica econômica neoliberal contribui para a grande fragilidade atual dos recursos naturais do planeta. Tal ideia é validada pela reflexão de Horkheimer, filósofo frankfurtiano, o qual afirma que a razão, durante a Idade Moderna, deixou de ser emancipatória e tornou-se instrumental, visando à dominação do homem e da natureza. Diante dessa perspectiva, nota-se que o intenso desenvolvimento da tecnologia, na contemporaneidade, é aproveitado pelos setores industriais para aumentar a extração de produtos naturais – como minérios, combustíveis fósseis e vegetação nativa – e, assim, produzir um maior número de mercadorias, alimentando a cultura consumista e a lucratividade comercial. Esse processo, porém, acarreta inúmeros prejuízos ao meio ambiente, impactos que inviabilizam a sobrevivência das gerações humanas futuras. Desse modo, a crescente destruição do planeta fomenta o seu estado de desordem.

Ademais, vale pontuar que a superficialidade das relações sociais contemporâneas, em razão do domínio do capitalismo sobre o cotidiano da humanidade, favorece a desestabilização do mundo hodierno. Acerca disso, é pertinente destacar alguns aspectos da obra literária “Quincas Borba”, de Machado de Assis, na qual o protagonista Rubião, após tornar-se herdeiro universal das riquezas de seu falecido amigo, se vê rodeado por amizades falsas, como Palha e Sofia, que se aproveitam da ingenuidade do amigo para absorverem o máximo possível de seu dinheiro. Tal situação relaciona-se intimamente ao cenário contemporâneo, no qual o mercado tornou-se o grande modelador da sociedade. Cada vez mais, o poderio econômico passa a ser um símbolo de destaque social. O enorme desejo dos indivíduos pela obtenção de dinheiro, a qualquer custo, resulta em um mundo marcado por uma forte desigualdade social e pela perda do interesse em um dos maiores privilégios da vida humana: a criação de laços afetivos.

Evidencia-se, portanto, que há uma desordem no mundo contemporâneo, caracterizada pela deterioração de aspectos intrínsecos à humanidade. Do ponto de vista ambiental, a extração inconsciente de recursos da natureza em função do comércio resultará em um planeta inviável à sobrevivência humana. Sob uma ótica social, as relações afetivas, fundamentais ao bem-estar coletivo, estão sendo sobrepostas por relacionamentos supérfluos baseados no dinheiro. Assim, a razão, manipulada pelo capitalismo, passa a, cada vez mais, dominar e destruir o homem e a natureza, conforme postula Horkheimer.

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