Qual a relação entre Psicopedagogia e TEA?

A Psicopedagogia é uma área do conhecimento que une a Psicologia e a Pedagogia e seu principal objetivo é a aprendizagem humana. Assim, o atendimento com um psicopedagogo é importantíssimo para o desenvolvimento das pessoas com autismo, pois esse profissional tanto pode descobrir as causas das dificuldades de aprendizagem, quanto fazer um trabalho terapêutico que estimule o aprendizado escolar e também das pequenas atividades do cotidiano. 

O Transtorno do Espectro Autista causa um comprometimento na comunicação, linguagem e interação social, sendo necessário, geralmente, um acompanhamento individualizado para a pessoa se adaptar à rotina escolar. Isso acontece porque, em muitos casos, o autista tem um ritmo diferenciado de indivíduos neurotípicos, ou seja, daqueles que não possuem nenhuma alteração neurológica ou têm o desenvolvimento padrão. Portanto, no TEA, pode acontecer desde um comprometimento nas capacidades linguísticas que o coloca em atraso em algumas matérias, até ter altas habilidades, quando as tarefas da sala de aula podem ser entediantes para ele. 

Assim, o autista habitualmente precisa de um currículo adaptado e estratégias de ensino que o motivem. Além disso, ele costuma ter dificuldades em interagir com os colegas ou apresentar variações em seu comportamento, como crises emocionais, estereotipias, hiperfoco ou resistência em realizar as tarefas propostas para a turma. 

Neste sentido, o psicopedagogo auxiliará no processo de inclusão e adaptação da pessoa com TEA à escola, pois, às vezes, essa não consegue atender à demanda apenas com a equipe pedagógica. 

A avaliação psicopedagógica 

O psicopedagogo começa seu trabalho fazendo uma avaliação detalhada de como está sendo o envolvimento do aluno com o processo escolar e com as relações que se estabelecem entre ele e os professores, ou entre ele e os outros alunos. A avaliação abrange um olhar sobre aspectos emocionais, familiares, cognitivos, sociais, biológicos  e de metodologias de ensino que estão interferindo na aprendizagem do sujeito e na adaptação à escola. Por exemplo, uma má adaptação em seu grupo social ou família pode gerar uma desatenção causada por aspectos emocionais, a qual irá dificultar para o aluno se concentrar nos estudos. Da mesma forma, aspectos biológicos como alterações na química cerebral podem interferir na aprendizagem, entre outras causas. A avaliação irá descobrir então quais são esses fatores que estão dificultando o aprender.

Para esta etapa, serão feitas entrevistas com a família, com os professores e com profissionais de outras áreas que também estão atendendo o indivíduo. A união e o diálogo entre o psicopedagogo, a família e os outros profissionais em um trabalho multidisciplinar em torno do autista é essencial, a fim de que todos os cuidadores estejam afinados e façam um trabalho complementar com vistas a um melhor desenvolvimento do sujeito. 

Assim, paralelamente às entrevistas, o psicopedagogo inicia o atendimento com o aluno, individual ou em grupo. Nas primeiras sessões, construir o vínculo entre o profissional e a pessoa com TEA é primordial, sendo que a aprendizagem está intimamente ligada aos aspectos emocionais e de socialização, e o autista já costuma possuir desajustes nestes quesitos. 

Além disso, é preciso estabelecer a confiança e a naturalidade nas sessões para que a terapia psicopedagógica se torne eficaz e agradável. O sujeito com TEA, às vezes, não se adapta aos métodos tradicionais de ensino, mas isso não quer dizer que ele não aprenda. 

Então, descobrir qual metodologia de ensino é a mais adequada para seu aprendiz é o principal desafio do psicopedagogo nessa fase. Da mesma forma, visualizar possíveis barreiras de aprendizagem torna-se imprescindível, como, por exemplo, aspectos emocionais, déficits cognitivos, contexto familiar ou social instáveis, e até outros transtornos do neurodesenvolvimento ou da aprendizagem, como dislexia, discalculia, tdah, etc, que são capazes de impedir ou atrasar o desenvolvimento escolar e intelectual. 

Após a avaliação, que dura em torno de algumas semanas, conclui-se essa etapa com um laudo psicopedagógico e pode-se encaminhar o aluno para profissionais como neurologistas, psiquiatras, fonoaudiólogos, entre outros, se for oportuno realizar acompanhamento, paralelamente, nessas áreas. Então, caso também fique evidente a necessidade de intervenção psicopedagógica, é feito um planejamento do atendimento. 

A intervenção psicopedagógica 

A intervenção psicopedagógica nada mais é do que colocar em ação os planos de melhorar o desempenho escolar e outras aprendizagens no cotidiano do indivíduo. Várias técnicas são utilizadas nas sessões de intervenção psicopedagógica, como o trabalho com jogos pedagógicos, brincadeiras, desenhos, artesanato, arteterapia, e até fazer um acompanhamento escolar nas matérias na qual o aluno tem obstáculos. 

O objetivo da psicopedagogia difere de um professor particular, mas também é importante o auxílio pedagógico para ensinar conteúdos pré-requisitos para outros, como a própria alfabetização. Nesse contexto, o psicopedagogo deve sim auxiliar no processo de alfabetização, mas não usará somente as técnicas de ensino tradicionais, e sim, o universo lúdico ou outras formas em que o aluno sinta prazer neste processo. 

No entanto, ensinar um conteúdo específico não é o foco da psicopedagogia. Durante as sessões de intervenção, o principal objetivo é retirar as barreiras de aprendizagem. Essas podem ser passageiras ou estar estruturadas na relação do sujeito com o conhecimento. 

Por exemplo, será passageira se um aluno estiver durante crises familiares como separação dos pais, e, portanto, mais sensível emocionalmente, trazendo impedimentos ao processar aquela experiência. Neste caso, o psicopedagogo pode usar técnicas artísticas na qual o aluno expresse seus sentimentos e organize melhor sua situação psicológica. Poderá também fazer sessões com a família com o propósito de orientar em que medida as relações familiares estão intervindo no processo de aprendizagem do indivíduo, e retirando sua capacidade de atenção ou de motivação para os estudos. Uma situação como essa, faz-se relevante o trabalho psicopedagógico aliado a um tratamento com psicoterapeutas ou médicos. 

Em outra situação, um indivíduo com autismo, pode ter hiperfoco em apenas uma área de interesse, por exemplo, os números. Por outro lado, está com atraso na alfabetização. O psicopedagogo poderá então descobrir como motivar o aluno para ter contato com a leitura e a escrita por meio de jogos, brincadeiras e pequenos combinados de realizar tarefas mesmo não querendo. 

Enfim, não existe receita de bolo, mas o psicopedagogo deverá ter um olhar atento para seu aluno e utilizar as formas que ele aprende melhor, desviando as causas de não aprender, mediante variadas técnicas psicológicas e educacionais. 

Saiba mais sobre as sessões de psicopedagogia em:

Sessões de psicopedagogia – Meandros da Escrita

Psicopedagogia e TEA: outras aprendizagens 

Uma vez que o psicopedagogo é especialista em aprendizagem humana, esse profissional também está capacitado para auxiliar os indivíduos autistas em outras disfuncionalidades da vida cotidiana, além da escolar. Pode ensinar como interagir com as pessoas, habilidades motoras e até como se comportar em uma brincadeira em grupo ou em um jogo de cartas, as quais são ações que exigem as habilidades de aprendizagem. 

Outro ponto a se destacar é que as teorias psicológicas comportamentais são essenciais para entender como os autistas aprendem. Neste sentido, psicopedagogos que possuem qualificações na área da Análise do Comportamento Aplicada (ABA) estão mais preparados para ensinar comportamentos adaptativos para pessoas com TEA, e até mesmo para ensinar modos de agir que são pré-requisitos de uma aprendizagem acadêmica e para a vida social. 

Por exemplo, para poder conviver na sala de aula, é necessário que antes de aprender as habilidades acadêmicas, o aluno saiba ficar algum tempo sentado e preste atenção no professor ou na atividade proposta. Então, o psicopedagogo, por técnicas comportamentais, ensina o sujeito a manter-se sentado, treina a habilidade de atenção e a sociabilidade do autista, e depois ensina tarefas como ler e escrever. 

Do mesmo modo, a psicopedagogia tem grande eficácia ao treinar habilidades essenciais na vida social dos indivíduos com TEA como a comunicação, a expressão oral e escrita, além de estar apta para potencializar funções cognitivas e executivas do neurodesenvolvimento, através de jogos, brincadeiras ou outras intervenções psicopedagógicas. 

Se o seu familiar foi diagnosticado com o Transtorno do Espectro Autista, e está com problemas de adaptação à rotina escolar, com atraso na alfabetização ou na aquisição de outro conteúdo, não hesite em fazer uma avaliação com um psicopedagogo. Assim, você permitirá que o seu filho se desenvolva de forma a aprimorar suas capacidades e minimizar déficits na vida escolar, familiar e social. 

 É importante lembrar que todos somos capazes de aprender, e a verdadeira inclusão está em entender que as diferenças de cada indivíduo irão contribuir para a formação de uma sociedade mais rica e com diversidade de olhares para a vida.

Autora: Maíra Pereira, Psicopedagoga e Terapeuta ABA – Atua com Psicopedagogia e TEA

(Artigo também publicado por mim na revista Meu Mundo Azul)