O transtorno do espectro autista é um transtorno do neurodesenvolvimento que acomete pessoas com alguma dificuldade nas capacidades de interação social, linguagem e comunicação.
Os autistas, muitas vezes, não são compreendidos por causa de suas características que podem ser diferentes dos indivíduos neurotípicos, como a forma como brincam, se comunicam e interagem com os outros. Também costumam ter crises emotivas ou comportamentais devido a dificuldades em se adaptar às exigências do mundo familiar ou escolar, que frequentemente não estão preparados para lidar com a diversidade.
Devemos partir do princípio que pessoas com TEA, assim como quaisquer outras, têm grandes potenciais, mas podem ter algumas especificidades em suas formas de aprender, tanto na escola, como em outros contextos. Por isso, enquanto psicopedagoga e estudiosa da aprendizagem humana, trago algumas dicas para ensinar indivíduos com TEA a fim de que possamos fomentar continuamente a inclusão em todos os contextos sociais.
1 – Acreditar na capacidade de aprender
Não importa se você é familiar ou professor de um indivíduo autista, mas se quer ajudá-lo a evoluir tanto em seus comportamentos quanto na aprendizagem escolar, é necessário que não duvide das capacidades de seu filho/aluno. Alguns indivíduos com TEA têm ritmos diferentes de aprendizagem ou alguns desníveis em relação a outras pessoas sem esse transtorno. Porém, acreditar na capacidade de aprender dos autistas é essencial para incentivá-los a subir cada degrau da nossa jornada diária. Pessoas autistas, como quaisquer outras, podem possuir dificuldades em algumas habilidades, mas com certeza, vários potenciais em outras áreas. Assim, devemos nos permitir conhecer esse sujeito em todas as suas potencialidades, para que estas sejam enfatizadas, assim como, em suas limitações, a fim de que sejam trabalhadas. O papel da família ou do professor que confia nas capacidades de seu aluno/filho é crucial para que o sujeito passe a acreditar em si mesmo, uma vez que se sentirá estimulado por seus cuidadores.
2 – Descobrir como aprende melhor
Em alguns casos, indivíduos com autismo não conseguem se adaptar aos métodos tradicionais de aprendizagem, mas isso não quer dizer que eles não aprendem. Então, o objetivo do instrutor é descobrir qual é a forma e a metodologia de ensino que o seu aprendiz se dá melhor, através de uma avaliação individualizada.
Geralmente, o profissional que faz essa avaliação é o psicopedagogo, o qual pode verificar as questões cognitivas, emocionais e sociais dos indivíduos em interação com o mundo e o conhecimento, seja este escolar ou da vida cotidiana.
A Psicopedagogia e a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) são duas ciências complementares nos cuidados com a aprendizagem dos autistas. Algumas estratégias advindas dessas áreas são de fundamental importância para o entendimento de como ensinar as pessoas com TEA.
Uma das estratégias psicopedagógicas é a exploração dos cinco sentidos do aprendiz, como recursos visuais, táteis, sonoros, tais que podem ser utilizados com o auxílio da tecnologia, mas não somente. Os sujeitos com TEA, frequentemente, são bem motivados com imagens, então podemos abusar de desenhos e fotografias.
Por sua vez, as técnicas da ABA sugerem que devemos sempre seguir a lógica de ensinar primeiramente o que é mais simples para o que é mais complexo, dividindo o objeto de aprendizagem em pequenos passos mais fáceis, ao invés de ensinar tudo de uma só vez.
Da mesma forma, é essencial preservar a motivação do sujeito, o qual deve ser desafiado, mas não a ponto de cometer vários erros e desistir. A aprendizagem sem erros é uma técnica que parte do nível que o sujeito está em relação ao que vai ser ensinado, e prioriza o fornecimento de dicas máximas, para que esse possa acertar a tarefa e receber um reforço positivo do instrutor, como um elogio ou recompensa. Aos poucos, o instrutor vai retirando as dicas até que o aluno consiga realizar a tarefa de forma independente. Dessa maneira, é imprescindível utilizar como consequências do processo de ensino vários reforços positivos, e minimizar as chances de errar do aprendiz, para que a motivação esteja sempre alta.
Outra dica é que os autistas costumam ter um hiperfoco ou interesses restritos, por exemplo, alguns são fixados em aviões, dinossauros, futebol, etc. Aproveitar esse hiperfoco e seus interesses é outra receita de ouro para que o indivíduo com TEA se envolva na aprendizagem.
3 – Respeitar o espaço e o tempo
Geralmente, a pessoa com o transtorno do espectro autista não sabe lidar bem com imprevistos ou mudanças de planos. Se por um lado, é necessário trabalhar a flexibilidade, por outro, para ensinar alguns conteúdos, pode ser mais adequado respeitar essa limitação e dar previsibilidade ao autista.
Neste sentido, criar uma rotina e até colocar no quadro ou em um papel o que será feito em dados espaço e tempo é muito importante para que o indivíduo com TEA se sinta seguro e aceite realizar as tarefas de aprendizagem.
Além disso, torna-se bem útil o uso de desenhos roteirizados, tanto produzidos pelo próprio cuidador na hora da atividade, como desenhos mais elaborados, produzidos anteriormente para uma atividade que irá ser trabalhada.
Por exemplo, em casa ou na sala de aula, caso o aprendiz tenha relutância em começar alguma atividade, mostramos um quadro de rotinas em que está escrito (ou um desenho roteirizado, expresso por imagens) que logo após aquela tarefa terá outra mais prazerosa. Assim, através de alguns combinados e explicações, o sujeito sente-se mais motivado e tranquilo para seguir uma rotina que já é conhecida por ele, em um tempo e espaço pré-determinados.
Em algumas situações, especialmente quando a resistência está maior, é interessante permitir que o aprendiz escolha entre duas opções dadas pelo cuidador. Mesmo que não possa escolher tudo, mas poder participar do processo decisório fornece mais autonomia e motivação para o indivíduo.
Portanto, respeitar as limitações, o ritmo de aprendizagem, o espaço e o tempo do sujeito autista é importantíssimo para viabilizar o ensino com qualidade.
4 – Aliança entre o sujeito, a família e os profissionais especializados
Cuidar da empatia e dos vínculos estabelecidos entre o sujeito, sua família e os profissionais é primordial para um desenvolvimento excelente das pessoas com autismo. Para casos mais severos do transtorno, ou mesmo para os mais leves mas que algumas peculiaridades do indivíduo autista estão gerando prejuízos para ele ou para as pessoas que convivem com ele, como um déficit na comunicação ou um atraso no desenvolvimento escolar, torna-se necessário contar com profissionais especializados como terapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos. Neste sentido, os profissionais que irão trabalhar no aprimoramento das capacidades do indivíduo devem estar em constante comunicação e empatia tanto com o seu cliente quanto com a família desse. A união e a interação entre a família, a escola e os profissionais especializados em torno da pessoa com TEA produz resultados promissores de desenvolvimento. A Psicopedagogia, enquanto área que une a Psicologia e a Pedagogia, é crucial para melhorar e intensificar a aprendizagem dos autistas. A família deve buscar profissionais que façam um trabalho individualizado e estimulem as capacidades do sujeito em todas as suas especificidades.
Portanto, sejamos pais, familiares, professores ou outros profissionais que irão conviver com pessoas com TEA, devemos sempre ter em mente que elas podem aprender muito e devem ser incentivadas e acreditadas em todas as suas potencialidades. Para construir uma sociedade que respeita a diversidade, é preciso entender que todos temos diferenças e é exatamente isso que enriquece nossa cultura e a disseminação de diferentes olhares para a vida.
Autora: Maíra Pereira – Psicopedagoga e Terapeuta ABA para autismo
maira.pereira.oliveira@usp.br
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Maíra Pereira é psicanalista, psicopedagoga e professora particular de Língua Portuguesa e Redação. É graduada em Letras pela Universidade de São Paulo, possui Pós-graduação em Psicopedagogia e Neurociências e atua também como revisora de textos em Língua Portuguesa.